Citações do dia

«A experiência alcançada pela execução do Despacho n.ºOA/PCS/2008-2010/1 , pelo qual se regulou o sistema de distribuição de processos, mostra a necessidade de proceder ao seu ajustamento. Tendo em vista descongestionar os sobrecarregados serviços da Secretaria do Conselho, que se encontram desguarnecidos de meios humanos e de condições condignas de trabalho, e a funcionarem ainda de acordo com uma lógica não compatível com a indispensável autonomia funcional do Conselho Superior e de modo a abranger também na lógica da distribuição os processos de laudo, procede-se à alteração do normativo respectivo.(...)» Lisboa, 29 de Outubro de 2008. José António Barreiros [Presidente do Conselho Superior da Ordem dos Advogados]

(...)« O Bastonário salientou, na apresentação da Colectânea de Jurisprudência do Conselho Superior de 2005 a 2007 [ontem, dia 30.10.2008], a preocupação do actual Conselho Geral pela dignificação, respeito e prestígio dos órgãos disciplinares da Ordem dos Advogados. Manifestou também o seu empenho e do Conselho Geral em ajudar os órgãos disciplinares no cumprimento da sua espinhosa, dificil e ingrata missão.(...)»

Entendimentos vesgos

Ontem fui ao CCB ouvir o prof. João Lobo Antunes recordar o escritor José Cardoso Pires, numa conferência sobre “Memória e auto-ficção”. Por causa dele acabei por comprar e ler, ontem mesmo, de uma penada, o «De Profundis, Valsa lenta», do escritor homenageado, e o prefácio que o conferencista escreveu para essa obra. Do escritor conheço pouco, confesso, mas do autor do prefácio leio tudo o que apanho, ensaios, artigos, mesmo aqueles sobre uma Deontologia que, não sendo a minha, é a da profissão que em tempos sonhei exercer antes de descobrir o que era um tribunal. Foi aí - no prefácio - que a propósito da doença que atingiu o escritor, encontrei um comentário ao treino da prática médica, que não resisto a citar aqui. Afirma, na pág.8: «(...) é também popular auscultarem-se manequins (de borracha, entenda-se), simular situações patológicas com actores treinados para o efeito, e outras invenções pedagógicas que permitem ao aluno aprender sem tocar em doentes de carne e osso, tudo isto, a meu ver, por um entendimento vesgo de como se deve ensinar o ofício hipocrático. É claro que assim é impossível os aprendizes conhecerem o estado único de "humanidade ferida", no fundo a essência de qualquer moléstia». Sem tirar nem pôr o que eu penso sobre certas decisões de afastar do patrocínio de casos reais os aprendizes do meu ofício, porque sei que é da essência de ambos os ofícios o tratamento da "humanidade ferida", não obstante a diferente natureza das moléstias.

«Elogio da sinceridade»

Charles-Louis de Secondat, barão de Montesquieu, é lembrado até aos nossos dias por ser o autor do princípio da separação dos poderes, ideia matricial dos Estados modernos, contida no livro «De l'esprit des lois», publicado, anonimamente, em Genebra, no ano de 1748. Aristocrata por nascimento e juiz de profissão, Montesquieu escreveu, além daquela obra maior da ciência política, vários discursos, entre 1717 e 1721, um dos quais intitulado «Éloge de la sincérité», uma virtude «que faz na vida privada o homem de bem e no comércio dos grandes, o herói». Escreveu Montesquieu: «Aqueles cujo coração se corrompeu desprezam os homens sinceros, porque estes raramente acedem às honras e às dignidades; como se houvesse mais bela ocupação que dizer a verdade; como se o que faz com que se faça bom uso das dignidades não fosse superior às dignidades mesmas. Com efeito, a própria sinceridade tem tanto brilho como quando transportada à corte dos príncipes, o centro das honras e da glória. Pode dizer-se que é a coroa de Ariadne que é colocada no céu. É aí que esta virtude brilha com os nomes de magnanimidade, de firmeza, de coragem; e, como as plantas têm mais força quando crescem em terras férteis, assim a sinceridade é mais admirável junto dos grandes, onde a magestade mesma do Príncipe, que empalidece tudo o que a rodeia, lhe dá um novo brilho. Um homem sincero na corte de um príncipe é um homem livre entre escravos. Ainda que respeite o Soberano, a verdade, na sua boca, é sempre soberana, e, enquanto uma turba de cortesãos é joguete dos ventos que reinam e das tempestades que troam em redor do trono, ele é firme e inabalável, porque se apoia na verdade, que é imortal pela sua natureza e incorruptível pela sua essência. É, por assim dizer, garante perante os povos das acções do Príncipe». [ed. Fenda, 2005, pág.21 e 22].
Há quem de Montesquieu só tenha lido o tratado político, para daí retirar as grandes ideias. É pena. Muitas vezes as maiores verdades encontram-se nas obras pequenas.